Capacitações do Núcleo de Educação em Saúde Coletiva incentivam profissionais a buscarem soluções para prevenção da gravidez na adolescência
A taxa de gravidez entre meninas de 15 e 19 da América Latina é a segunda mais alta do mundo, de acordo com dados divulgados pela Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, a gravidez não planejada na adolescência preocupa os profissionais de saúde da atenção básica, a “porta de entrada” dos usuários nos sistemas de saúde e por onde chega boa parte dos casos de gravidez nessa faixa etária. Prova é que a temática é recorrente nos trabalhos de conclusão dos cursos do Núcleo de Educação em Saúde Coletiva da Faculdade de Medicina da UFMG (Nescon), que têm a proposta de construir projetos de intervenção nas unidades de saúde onde os alunos atuam.
Os cursos são voltados para a capacitação de profissionais da rede pública de saúde e para a construção de políticas públicas na área. Somente em 2018, 22 trabalhos abordaram a gravidez na adolescência. Segundo Maria Rizoneide Araújo, membro da coordenação do núcleo, a escolha do tema é feita pelos próprios profissionais que participam das capacitações. “As questões de saúde são identificadas no território onde o profissional atua e ele seleciona uma para trabalhar, desde que seja de seu alcance”, declara.
Os trabalhos são desenvolvidos junto ao orientador, que auxilia na construção da metodologia científica, para que os resultados cheguem à população local. “Muitos levaram a questão da gravidez na adolescência como uma questão de saúde que exige atenção”, pontua.
A médica Raquel Nardelli está entre os profissionais que abordaram essa temática. Ela participou do curso de Especialização em Atenção Básica em Saúde da Família ofertado pelo Nescon, concluído em 2013. Na época, ela apresentou a proposta de intervenção “Gestação na adolescência na Unidade Básica de Saúde Sudoeste de Bicas – MG”, para ser implementada em Bicas, região da Zona da Mata de Minas.
Intervenção em Bicas
Segunda Raquel, na comunidade de Bicas, a gravidez na adolescência era tratada como algo regular. “Acredito que exista um fator cultural, mas a principal intervenção deve ser a partir da educação. Nos grandes centros existe uma grande facilidade no acesso à informação que não é tão comum nos locais mais afastados”, comenta.
A médica também ressalta a falta de oportunidades para as adolescentes, que crescem sem estrutura familiar. “Acabam ficando afastadas da educação, muitas não concluem nem o ensino médio. Quando engravidam, ainda diminui a possibilidade de conseguir um crescimento na educação e profissional. Principalmente nos muitos casos em que o parceiro não assume a paternidade”, reflete.
Por isso, sua proposta de intervenção focou em soluções para melhor orientação das adolescentes. Entre elas, a promoção de palestras e divulgação de informações sobre métodos contraceptivos no Posto de Saúde da Família da cidade. Raquel explica que a equipe trabalhou com a orientação de grupos de gestantes, principalmente para prevenção de uma outra gravidez precoce. Além disso, foram produzidos panfletos educativos e métodos contraceptivos passaram a ser disponibilizados na Unidade de Saúde.
Desafios
Raquel Nardelli reconhece que encontrou dificuldades para a implantação de medidas efetivas e duradouras de prevenção. “Eu estava em um município mais pobre, não recebemos muito apoio financeiro”, avalia. Outro desafio apontado por ela está na falta de uma equipe multidisciplinar para a atuação com esse público em municípios afastados. Ela relata, por exemplo, a dificuldade de conseguir apoio as adolescentes.
Para a membro da coordenação do Nescon, Maria Rizoneide, as dificuldades na prevenção da gravidez na adolescência também estão no diálogo com essa faixa etária. De acordo com ela, os adolescentes não têm o hábito de ir à Unidade Básica de Saúde para que os profissionais possam aproveitar o momento para orientações. “Para trabalhar essa questão, é preciso que seja feito o trabalho em conjunto com as escolas”, acrescenta.
Por isso, a professora avalia que a questão social também deve ser trabalhada. “As famílias precisam ter estrutura para manter as filhas na escola e a educação deve conscientizar sobre esse assunto. A educação sexual tem um importante papel, seja no ambiente escolar ou no familiar”, conclui.
*Guilherme Gurgel – estagiário de Jornalismo
*edição – Karla Scarmigliat