Principal elo entre a comunidade e as equipes de saúde, o agente comunitário de saúde (ACS), ocupa um papel fundamental para a Atenção Básica e a promoção da saúde coletiva. Esse profissional é responsável por identificar problemas, situações de risco e de vulnerabilidade a que estão expostas as famílias que vivem em sua região de atuação. Sua identidade com a comunidade, especialmente por residir no território em que atua, e seu papel de mediador social, contribuem para o desenvolvimento de ações de atenção a saúde que estejam sintonizadas com as necessidades da população.
Atuando na área há 16 anos, a ACS Maria Natalina Pinheiro, conhecida como Natália, conta que sua relação com os vizinhos e o lugar de liderança comunitária atribuído a ela foram determinantes para sua decisão de se profissionalizar. “Eu já fazia esse trabalho muito antes, sem saber o que era agente de saúde. Acabei me tornando liderança no bairro em que morava. Brincava muito com os meninos de futebol, conversava com todo mundo, aconselhava. Uma vez apareceu um papelzinho na minha porta chamando pra uma reunião para virar agente de saúde. O salário era simbólico, mas eu fui e a população me escolheu”, lembra Natália. Segunda a ACS posteriormente foi oferecido a ela um curso de capacitação, que durou aproximadamente dois meses.
Natália conta que, apesar das dificuldades, se sente gratificada pela chance de ajudar as famílias. “A gente percorre os bairros para cuidar dos moradores. Nossa missão é levar informações sobre saúde até a população, por meio do acompanhamento da família. Fazemos de tudo pra poder ajudar. Acaba que criamos um vínculo muito forte, participamos de tudo na vida dessas pessoas”, diz. Ao todo, são 160 famílias acompanhadas por ela, com uma média de dez residências visitadas por dia.
Atenção
A agente explica que na profissão é fundamental estar atento aos sinais apresentados pelo paciente, que podem significar um possível problema. “Tem famílias muito carentes, algumas precisam de mais dedicação. É muito importante a gente escutar, ter um olhar diferenciado. O profissional tem que conhecer, saber chamar o paciente pra conversar pra saber o que está acontecendo” afirma. Ela conta um caso em que sua percepção salvou a vida de uma família. “Cheguei com minha parceira para uma visita na área rural. Todas às vezes que chegávamos a uma das casas, as crianças estavam amuadas pela casa e o mais novo, com oito meses, sempre estava deitado. Nós não sabíamos se era por causa do calor, ou algo do tipo. Observamos que sempre que íamos sentar essa criança ela caia, não sentava de jeito nenhum. Quando fomos à casa da vizinha ela nos contou que os pais eram alcoólatras e davam cachaça para as crianças, para eles dormirem, porque não tinham o que comer”, lembra. Preocupadas com a situação, conversamos com o pediatra da equipe. Após uma avaliação, foi descoberto que a criança estava desnutrida, por isso não sentava. “Após três meses de acompanhamento, com a ajuda da escola e da equipe médica, ele já entrou no consultório do pediatra andando”, lembra.
Essa relação com a comunidade é, para ela, a parte mais delicada do trabalho. “É preciso ter cautela, se aproximar aos poucos, ter ética para fazer a abordagem, porque existem pessoas muito resistentes. Principalmente em casas com problemas com drogas. A gente conversa, com calma, conquista a confiança. E, depois disso, eles nos recebem como membros da família”, conta. “O agente tem que tomar muito cuidado, senão fica doente com as histórias acompanhadas no dia a dia. Mas eu estou com 61 anos, me aposentei e não fiz questão nenhuma de parar. Ainda estou forte, consigo andar bastante e pretendo continuar enquanto eu der conta. Eu amo o que faço”, se orgulha Natalia.
A formação do ACS
A Analista em Pesquisa e Educação em Saúde da Escola de Saúde Pública, Thais Lacerda, conta que um marco importante na formação dos Agentes Comunitários de Saúde foi a definição do Referencial Curricular para Técnico de Agente Comunitário de Saúde, no ano de 2004, desenvolvido pelo Ministério da Saúde e Ministério da Educação. “O documento constitui-se em referência para as instituições formadoras, apresentando o perfil de competências profissionais do agente comunitário de saúde nas áreas de mobilização social, promoção da saúde e prevenção de doenças, e monitoramento das situações de risco ambiental e sanitário”, explica. O Curso Técnico de Agente Comunitário de Saúde prevê uma carga horária total de 1.200 horas, dividida em três etapas. “A partir desse referencial, processos formativos foram desenvolvidos no país como um todo, com protagonismo das Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde (SUS) e financiamento do Ministério da Saúde”, conta Thais.
Atualmente, no estado de Minas Gerais, a Escola de Saúde Pública oferece o Curso de Qualificação do Agente Comunitário de Saúde, com carga horária de 400 horas. “Observamos que muitos cursos de temáticas variadas são voltados para os agentes comunitários de saúde. Entretanto, para além de iniciativas de formação assistemáticas, é muito importante fortalecer a educação permanente no âmbito da atenção básica, possibilitando assim que os agentes e sua equipe de saúde possam discutir as questões do cotidiano de trabalho e propor estratégias para mudanças no processo de trabalho” conclui ela.
O ACS e a Atenção Básica
Os agentes comunitários de saúde são responsáveis, juntamente com outros membros da equipe, pelo acompanhamento das famílias de um território previamente determinado, denominado microárea. Assim, os ACS realizam o cadastramento de todas essas famílias; o mapeamento do território; visitas domiciliares para acompanhamento da situação de saúde das famílias; orientação quanto à utilização dos serviços de saúde, além de diversas ações de educação e promoção da saúde. Ao todo, são aproximadamente 270 mil ACS atuando em 5.490 municípios, representando uma cobertura de mais de 128 milhões de pessoas.